sexta-feira, 14 de junho de 2013

Um pouco de história










Sem a colaboração de Tim Berners-Lee (e de seu colega Robert Cailliau) a Internet jamais teria sido o que é hoje.



Vejamos por que.



No final dos anos oitenta do século passado a Internet havia se tornado um imenso repositório de documentos. Funcionava também como meio de trocas de mensagens de pessoa a pessoa (correio eletrônico) e entre grupos de pessoas (grupos de interesse e de notícias) mas, essencialmente, era uma imensa biblioteca eletrônica.



Porém, quanto maior o repositório de documentos, mais difícil se torna encontrar aquele de que se necessita. Portanto o repositório de pouco ou nada adianta caso não ofereça também um a forma eficaz de encontrar os documentos de que precisamos. E quanto maior o número de documentos, mais premente é esta necessidade.



Pois bem: na era da Internet que precedeu a introdução da WWW, o meio mais eficiente para manejar, gerenciar e encontrar documentos na Internet era um programa denominado “Gopher” (que, em inglês, é o nome de uma espécie de esquilos) que usava seu próprio protocolo para armazenar, buscar e recuperar os documentos. No início dos anos noventa do século passado o Gopher era o nec plus ultra no que toca a busca e recuperação de documentos na Internet, representava o estado da arte. Veja, abaixo, em uma imagem obtida da Wikipedia (e ligeiramente alterada para ficar mais estreita e preservar a legibilidade) a interface de trabalho do Gopher.



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Figura 1: interface do Gopher (Foto: Reprodução)



Agora imagine que hoje, precisando de uma informação que você sabe que se encontra na Internet, ao se conectar para efetuar a busca, se deparasse com esta interface em vez das páginas multicoloridas com as quais se acostumou. Que tal lhe parece?



Pois é. Foi justamente isso que encafifou Sir Timothy… Encafifou tanto que ele se pôs em busca de uma solução. E, nesta busca, lembrou-se do artigo de Vannevar Bush “As We May Think”, comentado na coluna passada. Aquele que mencionava o conceito de hipertexto concebido por Bush.



Hipertexto é um conceito tão crucial para a WWW que não se pode falar na rede sem antes ter uma noção de seu significado e funcionamento.



Originalmente, “hipertexto” era um sistema concebido de tal forma que, ao selecionar uma palavra ou expressão em um texto e executar uma ação determinada, o leitor seria levado a outro texto correlacionado com a palavra. Complicou? Bem, isto é porque o hipertexto foi concebido em priscas eras, época em que não havia documentos digitalizados, décadas antes que os computadores se disseminassem e fossem “inventadas” telas, mauses e até mesmo a própria eletrônica. Porque, nos tempos atuais, quando tudo isto já está disponível, a melhor definição me parece a oferecida pela edição da Wikipedia em inglês onde, em tradução livre, “Hipertexto é texto exibido em uma tela de computador ou outro dispositivo eletrônico com referências [atalhos, ou “hyperlinks”, no original] a outro texto ao qual o leitor pode ter acesso imediato, usualmente por meio de um clique de mause, premindo uma sequência de teclas ou tocando a tela”.



Entendeu agora? Deve ter entendido, senão definitivamente não poderia estar lendo este texto. Afinal, você foi trazido até ele clicando em um atalho (“link” ou “hiperlink”) criado usando exatamente este conceito de hipertexto.



Em resumo: hipertexto é o mecanismo que nos permite “navegar” na WWW, saltando de página em página (ou para outro ponto da mesma página) no mesmo sítio ou em outro, sempre seguindo o caminho indicado pelos atalhos nos quais clicamos.



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Figura 2: Tim Berners-Lee em 2005

(Foto: Reprodução)



Estamos tão acostumados a usar o hipertexto na WWW que tendemos a achar que um nasceu com a outra e a outra nasceu com o um, se me permitem a liberdade. Mas isto é apenas meia verdade. É fato que a outra (WWW) nasceu com o um (hipertexto). Mas o inverso definitivamente não é verdadeiro: como acima citado, o hipertexto nasceu décadas antes da WWW. O que, certamente, foi uma obra de gênio, já que conceber um sistema de hipertexto sem as facilidades oferecidas pelos computadores modernos parece mágica. Portanto, deixemos de lado a concepção do hipertexto por Vannevar Bush entre os anos 1930 e 1945 do século passado e nos debrucemos sobre o trabalho de Berners-Lee (veja-o na Figura 2, obtida na Wikipedia) que levou à criação da WWW.



Em 1989, na CERN, Berners-Lee concebeu um programa que batizou de ENQUIRE, baseado no conceito de hipertexto. O ENQUIRE usava um banco de dados formados por “fichas” que continham atalhos (“hyperlinks”) que, diferentemente do que ocorre atualmente, levavam a outras fichas onde havia cerca de uma dúzia de citações de documentos referentes ao assunto do atalho (veja, na Figura 2, a imagem de uma tela mostrando uma “ficha” do ENQUIRE obtida do verbete correspondente da Wikipedia).



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Figura 3: tela do ENQUIRE (Foto: Reprodução)



O ENQUIRE chegou a ser usado internamente na CERN e é considerado o precursor do conceito da WWW (originalmente era um banco de dados que não implicava o uso de qualquer rede).



Ocorre que no início dos anos 1990 a CERN era o mais importante nó da Internet na Europa. E Berners-Lee estava mergulhado nela até o pescoço. Na verdade, quase a ponto de se afogar. E achou que precisava fazer alguma coisa para evitar o caos. E foi assim que a WWW foi criada.



Mais tarde Tim Berners-Lee declarou (citação da Wikipedia livremente traduzida): “Tudo o que eu tinha que fazer era juntar o conceito do hipertexto com as ideias de  TCP (Tranmission Control Protocol)  e DNS (Domain Name System) e – Tá Dá! – a World Wide Web… Criar a web foi realmente um ato de desespero porque sem ela a situação estava muito difícil quando eu voltei a trabalhar na CERN. A maior parte da tecnologia envolvida na web, como o hipertexto, a Internet, texto usando diferentes fontes, já havia sido desenvolvida. Eu só tive que juntar as peças. Foi um passo na direção da generalização, passar para um nível superior de abstração, imaginar que todos os sistemas de documentação existentes possivelmente fariam parte de um único sistema imaginário e muito maior”.



A sugestão inicial de Berners-Lee, em 1989, propunha usar o ENQUIRE como base do sistema de busca de documentos. Mais tarde, com a colaboração de seu colega da CERN Robert Cailliau, ele elaborou mais a ideia e em novembro o ano seguinte apresentou uma proposta formal para montar o que ele mesmo chamou de “WorldWideWeb” (assim mesmo, juntando as palavras), um “projeto de hipertexto” que seria uma rede (“web”) de documentos de hipertextos que poderia ser percorrida com programas navegadores (“browsers”) usando uma arquitetura tipo cliente-servidor.



Para implementar o projeto era necessário conceber um novo protocolo de troca de pacotes específico para o formato das páginas WWW. Este protocolo, o HTTP (“HyperText Transfer Protocol”), devidamente atualizado (está na versão 5) é usado até hoje.



Berners-Lee achava que uma rede básica poderia ser desenvolvida em três meses e que levaria mais seis meses para atingir o ponto em que “a criação de novos atalhos e novo material pelos usuários a tornasse um sistema de autoria universal”.



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Figura 4: o computador onde foi criada a WWW (Foto: Reprodução)



Berners-Lee usou o computador NeXT mostrado na figura 4 obtida na Wikipedia para desenvolver seu projeto. Nele, criou o primeiro programa navegador, que batizou de “WordWideWeb”, que acumulava as funções de editor de páginas web. E nele estabeleceu o primeiro servidor web que continha as primeiras páginas da web, também criadas por Tim, cujo objetivo era não somente explicar “como a coisa funcionava” como também fornecer um exemplo prático.



Em 6 de agosto de 1991 ele tornou seu projeto disponível para qualquer usuário da Internet postando um resumo de suas funcionalidades no grupo de notícias “alt.hypertext” da velha Internet. E a WWW começou a expandir-se lentamente, começando pelas instituições acadêmicas europeias.



O primeiro servidor Web fora da Europa (não confundir com servidor Internet, um nó da velha rede; um servidor web continha páginas web) foi instalado no SLAC (“Stanford Linear Accelerator Center”) em Palo Alto, Califórnia, EUA. A partir daí a rede começou a espalhar-se pela América do Norte e em seguida por todo o planeta, justificando o nome idealizado por Berners-Lee quando a criou, ou seja, tornando o alcance da rede efetivamente mundial.



Um dos fatores que ajudou significativamente esta disseminação foi a criação do primeiro programa navegador de uso praticamente universal, o Mosaic, desenvolvido em 1993 por Marc Andreessen na Universidade de Illinois em 1993, o primeiro a incorporar uma interface gráfica (nesta ocasião Windows 3, lançado dois anos antes, já dominava o mercado). No ano seguinte Andreessen lançou o Netscape Navigator, que durante anos foi o programa navegador mais popular.



Em 1995 a Internet foi “comercializada” (até então era estritamente proibido fazer qualquer tipo de propaganda e as menções a produtos comerciais tinham que ter uma justificativa aceitável, caso contrário o usuário seria, primeiro, espinafrado por toda a comunidade e, depois, caso insistisse, banido da rede) e tornou-se disponível fora da comunidade acadêmica e militar – em outras palavras, tornou-se acessível ao comum dos mortais como eu que digito estas mal traçadas e você que as lê.



A partir daí foi a explosão que se viu.



A Internet evoluiu, as espartanas telas iniciais da WWW que recebiam apenas texto passaram a receber imagens, depois sons, mais tarde filmes e ficou tão complexa e estava ameaçando se tornar tão anárquica que foi necessária a criação de uma organização não governamental sem fins lucrativos para padronizá-la e discipliná-la. E assim nasceu o World Wide Web Consortium, mais conhecido pela sigla W3C. E ninguém melhor para lidera-la que o próprio Tim Berners-Lee, que assumiu o cargo na criação do W3C e nele permanece até hoje.



E isto em apenas dezoito anos… (se vocês lembram da primeira coluna desta série, sabem que “veinte años no es nada…”)



Um bocado de história. Em um período tão curto que há por aí milhões de testemunhas…



Eu mesmo recordo da primeira vez que visitei o sítio do Museu do Louvre e percorri algumas das imagens de suas mais importantes obras de arte. Fiquei tão impressionado que mostrei as imagens a um amigo comentando que estávamos vendo aqui no Brasil imagens armazenadas em um servidor na França em tempo real (hoje ainda me maravilho quando uso o Skype ou algo parecido para me comunicar com amigos do Brasil quando estou na China, também em tempo real).



E, por vezes, penso como seria emocionante se pudéssemos navegar pelo primeiro sítio da WWW, aquele criado por Berners-Lee no início dos tempos (da WWW, bem entendido).



Não seria formidável?



Bem, impossível não é.



E se você duvida, espere a próxima coluna.



B. Piropo




Até o próximo Melhor do Planeta

Fonte: http://www.techtudo.com.br/artigos/noticia/2013/06/um-pouco-de-historia.html

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